terça-feira, outubro 24, 2006

7.Deck bar.

Podia se dizer Beira-corgo. Só beira. A Barranca. O barranco. Riba. Talude. Ou ainda bem menos criativo: Terceira Margem. Enfim Deck e Luis da Silva Neto entra.
- Sua graça? Pergunta esse forasteiro ao servente.
- Belmiro. E o senhor? pergunta ele.
- Luis. O que podemos beber, Belmiro? Pergunta esse ao falante. Belmiro fala com sofreguidão de cotovelos sem balcão e inépcia dos que tudinada têm a dizer. E ai bastam trinta segundos e já se saberá um pouco mais do desnecessário, via sabichão!
- Como é sua receita de drai Martini? Pergunto. Adoro ver orgulhos brilharem sem porquês. E mentirosos engolirem cuspe passando pelos nós guturais.
- Misturo gelo com casquinha de limão. Lavo esta mistura com gim importado. Lavo o copo de drinque com o Martine seco. Deixo escorrer, a parede fica úmida de Martine seco, despejo no copo o gim gelado com o óleo do limão. Fala o cara como se estivesse sido tomado pelo Silvio Lanzeloti.
Calei-me. O bar fora de outro dono. Agora pertence a Wirto. Belmiro dizque inventou os drinques. Doze anos na faina. Muito embora, muito jovem!
- Então me vê esse Brasileirinho. Digo.
- Brasileirinho na dois Antoine. Grita Belmiro. Barmens e cozinheiros são sempre surdos. Ou garçons não sabem falar baixo.
Na mesa onze um casal com seu filhinho quadrúpede, insiste para que o filho não lata. A besta segue seu instinto, esquece Pavlov, late, rosna, volta a latir para Luis. Luis olha com carinho comedido para o animal. A mãe do cachorro se desculpa, mas Luis lhe faz ouvidos moucos, e segue acocorado ao lado do filhinho impertinente. Luis poderia estar pensando: será que um dia voltaremos a nos acasalar com os animais? Não sei porque? Na infância comia terra e fezes!. Namorava com cabritas e éguas e melancias e bananeiras! E fumava talos de chuchu. O pequeno cão agora senta-se sobre as patas traseiras, deixou cair as orelhas. Seu pai neste momento o imitava. O cinosuro levantou-se, olhou fixamente para o cãozinho e deu um latido forte.
Au... e olhou para a mãe com um sorriso amarelo. A mãe fulminou-o com olhar canino e disse
Mal educado. Hum! E tudo em seguida pedia a conta, enquanto o pai acudia o filho, que se babava e latia e rosnava.
Eu só retribui as boas vindas. Disse Luis fazendo cara de vira-lata.
O palco está sendo montado. Teremos Daniel do cavaco, Pleimobil no bandolim, Marcelo Faleiros no violão, Chic’Óreia do pandeiro e Anderson Alves e sua famosa Chupeta preta. Aparelhagem montada. Ligeira passada de som.
E vai entrando gente no bote de Caronte.
Onde está Luis? Por agora só tenho indícios de um homem e tais e poucos que até parecem nada para um personagem. Se não há personagem então narremos. Isso me fez a um circulo viajar. Creia-me.
Belmiro chega com o Brasileirinho para mim. Continuo personagem a umas boas paginas. Caipirinha, verde do limão, amarelo do maracujá, com gotas de Curaçao blues. É ano de copa.
- Obrigado. Digo.
- É para isso que estamos aqui! E emendou. O Sr. é daqui? Pergunta Belmiro.
Cioso como todo sousense desse rincão campineiro, de trilhas e áreas verdes e os rios já apresentados. É um lugar apreciado pelos amantes da natureza. É um lugar que já foi tranqüilo, mas ai o pessoal que gosta de lugares tranqüilos, foi chegando, chegando, comprando lotes, irregulares, que o tempo regulariza, vieram aos milhares, de tal modo e maneira, que a tranqüilidade já anda intranqüila.
Agora os que aqui estão empenham-se na proteção, para que assim permaneça, como se o Saara devesse ser preservado.
De onde era me piquei e já que você quer saber, também quero! Qual o tempo de chegada aqui necessário para ser daqui? Divago.
- Tem que nascer aqui! Oras bolas! Diz ele.
Bem, já estive em toda parte. E onde nasci, vivi menos anos dos que aqui vivo e aqui vivo a menos tempo que em outros onde estive.
Então você não é de lugar nenhum. Disse-me Belmiro.
Ai é que pega, sou um homem, com seu território móvel.
- Como assim? Demanda o desentendido Belmiro.
- Assim veja! Como um caramujo, carrego meu estado, meu município,o povo, a língua e minha casa! Reformulo.
Eu nasci aqui. Belmiro responde assertivo.
Eu nasci em toda parte e nenhuma.
Cada uma que me aparece! Vai Belmiro resmungando. Para além da mesa dos perdigosófilos de chorões, que por não terem vocal nem são tantos. E a baba escorre mesmo pela clarineta.
Deve ser a mesa dezoito, aquela, não? Há nela um sujeito que se poderia tomar como ente, melhor dito e a propôs de uma descrição não discreta, metido dentro de um kit completo caracterizador de um D que trabalha com o imediato do tal do desejo, despojado, quase Zen, numa boa, numa bermuda com mais bolsos que patas uma centopéia, um chinelo de couro com uma argolinha que prende o dedão (unhas de podólogo), tirou neste instante a camiseta onde se lia I Born to be wild. Estende a camiseta no espaldar da cadeira. Escorrega-se nela para a ponta do assento dele e da cadeira. Encosta-se no espaldar com a cabeça entre as mãos com dedos entrelaçados e cotovelos em asas. Olha para o sol através do preto e largo Lagerfeld. À espera me parece. Narcíseo? Um tanto, sim, Mas não é tudo. Tampouco todo. Alguma beleza ele espera. Em boa hora já a tem somado a si. Intriga a postura por parecer esperar alguém melhor. Isso mesmo. Ele sabe que o que espera é melhor que ele. E isso o faz grande. Vazando de si. É isso mesmo, como fico feliz por escrever essa besteira. Ele vaza. Sinto-o daqui e creio não ter ele aquelas preocupações: Será que ela vem? Parece não haver incertezas. Aqui vou eu gastando reticências.
A porta dos fundos do Deck acaba por ser principal. Está mais para entrada socializada, que para entrada social. Deixo isso para lá antes que me esqueça e me deixe enveredar por estas insolubilidades da humanidade indefensável.
- E Luis?
- Sim, continua a ser o herói. Como você percebeu estava eu curtindo uma de personagem. Luis depois de uma recepção canina acaba de ajeitar-se num tamborete à beira do balcão. Ao balcão o ser não é em si. Sim um incômodo incomodado. O chegar e sair dos garçons incomodados eles também com o ser aporrinhado. Mas o freguês tem sempre razão. Mesmo assim obstrui a boqueta para os copos cheios que saem para serem bebidos e voltarem quando são os mesmos. Agora imprestáveis. Cheios de batons, babas de bêbados, pequenos cacos de aperitivos já dissolvidos pela mistura de bebida e amilase.
Luis se distrai num jogo de adivinha. Como se tivesse tempo para cachorro. Quem teria neste ou naquele copo bebido? Inventa regras, com batom é de mulher, sem batom a pergunta deve ser: não é de mulher?
Segue o tempo correndo e sendo inútil contrariá-lo, Luis lembra-se de Laura e não queria. Que fazer? Laura o atrai ainda mais quando mingua, então sua mente foge para a remota Lins a contar vaga-lumes, integrais, diferenciais e às vezes moscas no pousa mosca do bar do Chino. Resolve uma integral de zero a três dx dividido por (x-1) elevado a 2/3 donde temos que lim quando b tende a 1 pela esquerda da integral de zero a b de fxdx mais o limite de c tendendo a 1 pela direita da integral de três a c fxdx. Luis diz que o resultado será divergente gerando uma figura tal e qual uma tenda de circo com um buraquinho no infinito, mais umas pinceladas de cafifa.
O pensamento ocupa-lhe como uma nuvem de moscardos, melhor dito Laura sempre volta como um bando de pernilongos zumbindo, mas de novo salva-lhe a nostalgia Linense, um desejo de beber cerveja com o pessoal da turma de engenharia de 1978 e as únicas duas meninas da classe. Amélia, Maria Amélia. Marélia, Mamélia, Amaria. Balança a cabeça dando-se a entender que hoje a vontade passou, só não foi esquecida, mas é já sem brilho, catarata, sim é diferente de Laura, que ainda lhe rubra o rosto. À época sobrava calor faltava verba, mas até isso é uma frescura. E o banho e a água pesada de Lins que não desensaboava a sujeira ancestral misturada à espuma cremosa do Lux de luxo.
Recorda-se do amigo de pensão Luis Vasconcelos.
- Onde andará? Será que desensaboado? Luis pensa no amigo irritado no banho. E o quê fará da vida Luis Vasconcelos? Pergunta-se Luis da Silva Neto e a si responde com uma matriz de variáveis,
O chope chega no choro. Luis bebe como se aquele faltoso copo de chope brindado, transbordante, digno de ajoelhamento não penitensioso, outorgador de luz radiante amareliça na parte não leitosa, à uma tempestade de júbilo levador. Um Ah! Soprado gutural esvaziador de pulmão. Luiz produz junto com um estalo que conseguido de vácuo bucal de lábios serrados com sucção diafragmática no que força o músculo do queixo no sentido de abrir a cavidade saboreadora gerando a tal explosão pela rápida ocupação do vácuo bucal. Tudo seguido daquele um: Ah! Atarantado, prosaico e louco.
Luis saboreia a depressão inclusive. Vejo-o depois de belo copo de chope cremoso, na volta ao assunto da matriz a dizer.

Copo? Presente à mão.
Cigarro? Presente sempre à mão.
Pensa? Pensamento sempre à mão. Luis volta a Luis Vasconcelos que era um homem lutando, querendo trocar lama por água limpa. E lá vem ele de novo. Luis Vasconcelos não sabia que a lama é que limpa. Nosso Luis sorri amarelo, desdenhando vicissitudes do descaminho.
- Fala Jotajota! Chama o serviço.
- Mesa indeferida? Pasmo ainda em meio a luta por se desamarrar, responde Luis menoscabando-se.
- Ahn? Fez Belmiro num agulho. E troou - Vocês estão todos loucos, o personagem da mesa dois, (e este sou eu), e como dizia Belmiro, é outro engraçadinho, cada homem um estado onde já se viu! Belmiro na mais pura rabugice.
- A mesa um pediu a conta. Explica o serviço, já um pouco mais centrado.
Ah! Valeu. Diz o servido que agora vira conselheiro. Desencana meu, doze anos na praça e ainda não aprendeu.
- Quanto mais rezo... Disse Belmiro conduzindo sua bandeja bordejada de inox repleta de lindos copos de chope.
O bar ainda não está cheio. Mas o freguês sente-se e senta-se melhor, assentado sempre na escolhida extensão de quatro patas bambas sem maciez para as partes macias formigarem que o bar oferece. Belmiro não argumenta mais. Cala-se ou ri amarelo. Cada um tem sua mesa da diretoria. E enquanto não conseguem o capricho incomodam o aparelho. Um quer olhar o rio, outro mirar gelosias espelhadas décor esparramadas pela parede do bar, não sei se uso bem essa palavrota chicobuarquiana. Outrossim, não tem importância. Volto aos fregueses, e estes querem ficar cerca aos músicos, uns outros longe de músicos perto da música. Uns nos cantos. Outros no meio.
Luis quer sempre a mesa um, longe dos músicos junto à musica e perto do balcão onde agora está. O chope chega sem ficar por ai excursionando, já disse. E disse também que não era toda a explicação, talvez a limitação de não haver mais nenhuma mesa para trás da linha de seu ombro o que dá segurança e uma visão plena do que acontece.
- Meia-pressão. Oferece Belmiro.
Chope presente Luis levou-o ao seu novo endereço. Mesa um.