Na nove, mesa de plástico branco, quase na saída entrada do bar que beira o rio e a rua, sentou-se Ledório, ele lê a Folha pensando o jornal como posto mais avançado da intelectualidade paulista. Como homem que se pretende inteligente, se obriga a retrucar diariamente a critica dos críticos aos críticos fazeres de nossa representação democrática. - Falácia! - Diz Ledório. -Falaciosa democracia sentada em minhas costas -. –Falácia -. Meu voto, meu poder despojado obrigatoriamente –. Rumina Ledório. Ouvi dizer que ele carrega um medo único. Parece coisa ridícula, uma bobagem sem pé nem cabeça. Você pode achar risível e banal essa história. Foi por isso que resolvi passar a limpo. Os freqüentadores do bar Central e do Esquinão o chamam de Cérbro. Uns no bar Central quando querem falar “direito” dizem: Celebro. De todos ouvi - é muito inteligente - fala línguas, estudou na Unicamp, mas por culpa do tal medo, abandonou tudo e toca aquela loja de rações. Tentou trabalhar no açougue do Facina, mas não se deu bem. Às vezes nos jornais lidos e relidos por ele nos quais embrulhava as carnes, aparecia um quadrinho que de longe via se tratar de uma enquête. Com medo de em uma dessas horas o olhar fugir de um lugar e se fixar perigosamente em outro, e ter que responder ainda que mentalmente a tal pergunta, deixou o açougue. Lê os jornais e muito embora eles tenham se banalizado, mantêm cadernos onde Ledório se encontra seguro. Mas a cada reforma editorial, acode aos cadernos com muita precaução. Demora muito tempo a voltar a velha confiança. Mesmo em cadernos de economia, política, de noticias internacionais onde os assuntos são selecionados. Não se encontra seguro. Sabe que ocorre às vezes de ultima hora uma nota que deveria estar lá no tal lugar e não está, pois o tal caderno deve ter sido fechado antes dos outros, que sempre ficam esperando mais uma fala chula do ministro. Está sempre atrás de soluções para o seu tormento. Quis cobrar do nobre deputado, nosso vizinho, uma micro mudança ortográfica. Onde se obrigasse à utilização do “?” invertido antes do começo da pergunta. Ademais como já o fazem nossos vizinhos do Mercosul. Por fim não teve coragem, e por isso aumentou a precaução ainda mais. Em anos de sufrágio, quando proliferam as pesquisas de opinião, ele sempre muda de calçada e atarantado balança a cabeça para lá e para cá, e vai resmungando “não! Não! Estou sem tempo agora, me desculpe, se faz o favor”. Diz. No estádio, muda de lugar quando aquela luz o ilumina, não fica para ver o microfone querendo entrar em sua boca para desentupi-lo. Nem de brincadeira, nas ante-salas de qualquer consultório, folheia revistas velhas. Fica nervoso ao abrir a página de seu provedor da internet, fixa os olhos nos “x” fechadores de janela, mantém a setinha do rato sempre a postos para clicar mais rápido que o Clint sacava seus colts. Ao ver a palavra “responda” num piscar de olhos clica. Via de regra vai direto ao seu correio eletrônico. Na lixeira nunca esteve, deixa que o provedor resolva por esvaziar. Remove qualquer coisa minimante desconhecida, sem abrir. Abre somente o que tem absoluta certeza. Vive do medo que lhe perguntem o que acha ou pensa da Rita Lee.
No mais Ledório é um resignado, no seu não fazer, o seu fazer tem pouco valor de troca reduzido diante do por consumir que lhe impacta. – Falácia -. Diz econtinua. Eles me viciam, suas analises pontuais, cercadas de arame farpado para que não escapem do cercado da ordem sequer olhem pelo buraco da cerca. – Falácia -.Diz ele e continua: sou consumidor inveterado de falácias, com seus miligramas de incoerência e outro tanto de verdades parciais. Diz mais: é melhor ler o Cony que anda lentigraxo equilibrando-se na cerca. Sim hoje é o Cony. Diariamente Ledório elege um articulista ou cronista para malhar no painel do leitor onde nunca nada seu foi publicado, mas Ledório não desiste, envia via eletrônicos meios e imprime uma cópia que a esta altura do dia está colada num poste, sonha em ver no painel seu nome impresso. - Hoje está fraca esta folha só me resta mesmo o Cony - diz de si para consigo. Não Cony não. – arrepia-se - parece uma azeitona Azapa com sua carnosidade escura aparentemente espetável, mas quando com o palito tenta espetar só consegue mesmo tangenciar e a Azapa desliza para o lado e sobe na beirada do prato raso, quase foge, mas derrapa na rampa e volve, como uma criança no escorrega, ao centro do prato. Há que se espetar bem no meio da parte mais alta do cós, não no umbigo que fica no pólo. Pensa Ledório e ademais são dois umbigos, melhor dito, olho e umbigo que não se vêem, se fosse o caso diria ao olho, olho você é ônfalo, umbigo fique de olho, não ia adiantar é o caso de ser certeiro, mas acabará por ser num golpe de azar. Ledório não precisa ler, é um idiota quase autodidata, não fosse o curso de letras no IEL. Enquanto isso na mesa um o mesmo continua igual.
terça-feira, novembro 21, 2006
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